terça-feira, 20 de agosto de 2013

Contrastes tácticos: Erros básicos

A primeira parte do Benfica no Funchal foi, provavelmente, a pior a que me lembro de ter assistido uma equipa de Jorge Jesus fazer sob o ponto de vista do ataque posicional. Um momento de jogo em que o treinador encarnado sempre habitou a fazer a diferença e onde as suas equipas eram claramente acima da média. Sobretudo em termos das dinâmicas criadas, fruto de posicionamentos certos e muito trabalhados. O que assistimos na Madeira foi uma equipa do Marítimo extremamente bem posicionada e concentrada, e um Benfica a pecar em momentos capitais, com erros típicos que já não se usam a este nível.


Matic tem bola e procura linhas para jogar. O Marítimo fecha de forma evidente qualquer entrada pelo corredor central, obrigando o Benfica a lateralizar e tentar entrar por fora. O espaço entre-linhas simplesmente foi abafado pelos verde-rubros mas Matic tem duas opções: passe de ruptura nos corredores laterais. Enzo Pérez, um dos mais esclarecidos, aponta-lhe o caminho. O sérvio faz isto.


Progressão (aceitável, para fixar um dos defesas) mas o posicionamento e movimentação que Djuricic fez retira-lhe uma das opções: má leitura do 10 do Benfica a posicionar-se num espaço que elimina uma das linhas de passe possíveis, mas que liberta a de Lima. Contudo, numa fracção de segundos, Matic já tinha tomado a decisão, difícil de alterar a meio da execução, e mais um passe errado. Repare-se ainda no posicionamento de Enzo Pérez. A culpa não é sua, claro. Neste momento tem de descentralizar a zona de pressão do Marítimo. Colocar-se fora do centro de jogo (triângulo então definido pelo Djuricic) e dar largura pelo seu corredor. Fica no meio. Facilita o Marítimo.


Imagem 3. Matic com bola e tem junto a si Gaitán, que veio pedir jogo. Amorim, simplesmente a olhar, quando podia procurar oferecer uma solução. Cortez sem sentido de ruptura, e Maxi, quando devia estar aberto, perto do colega, facilitando a tarefa de Sami que na imagem já está completamente dentro do corredor central a fechar uma linha de passe entre-linhas (para Djuricic). Erros atrás de erros.


Amorim com bola. Matic a 2 metros, linha de passe possível para Gaitán que dá largura mas vejam o posicionamento de Enzo Pérez. Mais uma vez, só pode ser do hábito. A largura e profundidade dada pelo corredor devia ser dele. Devia também largar aquele espaço, levar com ele o defesa, e permitir um apoio frontal de Djuricic ou Lima. 


Princípio básico do jogo. Matic com bola, Amorim perto. Uma vez mais. Já percebemos que este erro foi constante. Mas o triângulo de circulação para definir o centro de jogo onde está? O garante da progressão? O jogador que procura receber para jogar de frente? O apoio frontal? A pergunta fica explícita no ponto de interrogação. E Matic, claro, sem outra opção, tem de jogar para trás.


Djuricic, uma vez mais, mal posicionado, e o centro de jogo que mais uma vez não existiu. Matic não tem outra opção se não voltar a lateralizar o jogo. Mas pelo corredor central conto 4 jogadores do Marítimo prontos a bascular e o Benfica apenas com o portador da bola. Impossível.


Primeiro lance em que Djuricic aparece entre-linhas e consegue receber e rodar. O problema é que o posicionamento de Lima é o que vemos. Limita-se a olhar, e a sombra na imagem do lado direito é um jogador do Marítimo. Alguém adivinha? Djuricic lateralizou, o Marítimo basculou, e o Benfica não conseguiu penetrar uma vez mais.


Imagem que define tudo o que foi possível ver. Djuricic está com Enzo numa zona perigosa, abrem-se 2 possibilidades de fechar o centro de jogo, com o posicionamento de alguém, quer em ruptura, quer em apoio. As zonas definidas permitem-nos pensar o que estaria o resto da equipa à espera para oferecer uma opção. Os 2 jogadores do Benfica que aparece na imagem foram obrigados a tentar uma combinação directa contra 4 elementos e acabaram por perder o lance.

Tantos erros não são normais em jogadores que à pouco tempo eram tão inteligentes e fortes nestes processos. Parece-me claro que há um desgaste, e grande, em relação a tudo o que é o processo e o cansaço existente é sobretudo psicológico. As decisões não podem ser boas, o pensamento não pode ser o melhor, quando não estamos focados e disponíveis nas acções que realizamos.

17 comentários:

  1. Boas,
    Permite-me uma questão,ou melhor duas:
    Não é esse o posicionamento habitual dos jogadores do Benfica, principalmente quando não está Cardozo? Refiro-me nomeadamente aos apoios frontais e ao espaço entre-linhas?
    A segunda prende-se com o factor linhas de passe por dentro. Ou seja, o Benfica, apesar de se posicionar bem, posicionava-se por forma a conseguir linhas de passe por fora, orientadas para o cruzamento e jogo exterior, colocando muita gente na área a entrar depois.
    Repara no primeiro lance de Matic e nos seguintes: Sempre 5 homens a frente da linha da bola, estando ele já no último terço. Ou seja, há muitas soluções para jogar em profundidade, e poucas para jogar apoiado.

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  2. E o Cardozo a preparar o físico para ir jogar algures...

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  3. Baggio,

    O Benfica tem posicionamentos muito diferentes da maioria das equipas, é certo, mas como o jogo da Madeira não me lembro de ter visto muitos. É certo que o futebol idealizado por nós provavelmente, o Jesus não partilha, mas ele não se resume a procurar entradas por fora, muitas vezes vemos os próprios laterais com e sem bola a quebrar esse espaço entre-linhas e a procurar a ruptura por dentro. Sei de situações que o próprio feedback para os laterais é direccionado nesse sentido em termos críticos: "Não vais uma vez por dentro!", para o Luisinho por exemplo. O problema é que neste jogo o posicionamento do Amorim foi quase sempre tão mau, que limitou e muito o Matic, mas os outros posicionamentos foram muitas vezes errados e parece-me fácil percebermos o motivo: Djuricic fora das dinâmicas da equipa e más leituras; Lima não tem o mesmo rendimento a jogar como referência, possivelmente porque lhe pede outros entendimentos do jogo que ele não está preparado; Enzo Pérez que considero um dos jogadores mais cultos da equipa fora de lugar e a querer jogar no habitat;

    Concordo em relação ao que procuras dizer de Cardozo, porque sem ele o que temos visto é a falta da referência e sobretudo uma ideia de jogo que se pretende a mesma mas não tem, neste momento, forma de ser potenciada sem o seu elemento preponderante que é o paraguaio.

    Em relação à profundidade, o Benfica lateraliza sempre muito o jogo e consegue facilmente superioridades nos corredores laterais. O volume é direccionado para fora, muitas vezes. A questão é: Com um Marítimo sempre a colocar o avançado a pressionar apenas na zona do Matic, e uma linha de 3+1 (Danilo) em basculação, obrigando o Benfica a jogar sempre por fora, os jogadores do Benfica deram a resposta contrária: Enzo a vir para dentro, Gaitán a vir para dentro, e a largura só oferecida pelos laterais era curta porque não tinham referências na frente para criar um 2x1. Para além dos maus posicionamentos, acho sobretudo que houve uma má resposta e uma má reacção ao que os momentos do jogo iam dando.

    Um abraço e obrigado pelo comentário.

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  4. "mas ele não se resume a procurar entradas por fora, muitas vezes vemos os próprios laterais com e sem bola a quebrar esse espaço entre-linhas e a procurar a ruptura por dentro."

    Sim, como é óbvio. Também os Alas o fazem algumas vezes. O problema aqui é 1: Regularidades... E é isso que os jogadores vão fazer a maior parte do tempo, e é isso que torna a equipa tão forte, como equipa. A velocidade colectiva que se consegue ao executar determinada tarefa complexa(pensar o mesmo, ao mesmo tempo). E isso é impossível com interpretações do jogo díspares. Então, como os jogadores não têm o mesmo/melhor entendimento de quando se deve fazer o quê, opta-se por especializar a equipa num determinado tipo de movimentos. Não existe nenhuma equipa forte em todos os estilos de jogo, nem nenhuma equipa que consiga fazer o que o jogo pede a cada momento. Há sim equipas, que consoante o modelo que seguem, conseguem resolver os problemas (dentro daquela ideia) de forma extraordinária.

    Então a questão que fica é: Estará Jesus a tentar mudar alguma coisa? Nomeadamente colocar mais gente dentro? Estará a mudar a dinâmica de criação de linhas de passe? até que ponto a confusão neste jogo, não se deverá a isso?

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  5. Baggio é uma perspectiva interessante e que merece análise nos próximos jogos. Mas não consigo conceber um modelo para este Benfica que não conjugue Djuricic e Markovic no mesmo onze e a potenciá-los onde são mais fortes: zona de decisão, corredor central. Pode fazer sentido o Jesus andar à procura disto, daí a inclusão de mais gente por dentro, mas só mesmo vendo e percebendo a ideia.

    Um abraço e obrigado pelos comentários

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  6. O meu Benfica:

    Artur

    Ruben Amorim
    Luisao
    Garay
    Melga

    Matic
    Enzo
    John
    Djuricic

    Markovic
    Lima

    4-4-2 Diamante, John (como Di Maria no primeiro ano de Jesus), encarregue pela largura.
    Enzo como Ramires, encarregue pelo equilíbrio na zona central (largura assegurada por Melga).
    Djuricic com Aimar, Markovic como Saviola, Lima como Lima

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    1. Bafio se me permites, no teu diamante colocas o john a direita e enzo a esquerda certo?(isto por garantires a profundidade do melga quando o enzo garante o equilíbrio ao centro)...n achas que o john rende muito mais na esquerda?...e tb o enzo na direita?... No mais, gosto desse onze...

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    2. Este comentário foi removido pelo autor.

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    3. Baggio...isto da escrita inteligente tem destas...

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  7. O meu Benfica face aos jogadores que estão cá esta época tinha de colocar sempre 3 jogadores no meio-campo para permitir, de forma declarada, a posição 10. E seria com Enzo e Matic como duplo pivot com dinâmicas colectivas que permitissem inclusão do Enzo em zonas mais adiantadas e a saída do 10 para o centro de jogo em qualquer zona do campo, abrindo o tal espaço entre-linhas para a entrada de um dos extremos nesse lugar (à James) que seria o Markovic. Dessa forma conseguiria-se ter os 3 melhores jogadores da equipa na zona de construção, em teoria, pelo corredor central e sem atropelamentos: Matic, Enzo, Djuricic. Com o jogador mais forte na zona de decisão em termos de imprevisibilidade e pelo corredor central: Markovic.

    Artur

    Almeida (ou Amorim)
    Lisandro (ou Steven)
    Garay
    Melga

    Matic
    Enzo
    Djuricic

    Salvio (ou John)
    Markovic
    Lima

    PS: Também gosto do Ola John, ao contrário da grande maioria. Não é tão repentista nem de tantas correrias como os outros e por isso descredibilizam-no. Contudo é o extremo que melhor pensa o jogo mas incompreendido pela dinâmica da equipa. Tem o problema de por vezes não conseguir executar a melhor decisão tomada fruto de uma falta de confiança que me parece evidente desde que chegou.

    Vou incluir o teu blog na lista dos recomendados.

    Abraço

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  8. Daniel Duarte,

    Sim, é pertinente a questão do Ola John. E talvez renda melhor do lado esquerdo.
    Porém, eu tenho um problema pessoal com o Maxi Pereira: Não gostar de cavalos nos corredores, ainda por cima com palas, porque nem defender ele sabe... Então, assim fico sem laterais que garantam profundidade no corredor direito.
    Assim sendo, só uma alternativa me agradaria: Sálvio como Lateral direito, responsável pela largura, e John como médio esquerdo.

    30,
    Percebo a tua intenção, mas eu para jogar com um 10 clássico, só o faria 4-4-2 em losango, o 4-3-3, só gosto dele com um pivot e dois interiores. Uma questão de preferência apenas, pelas dinâmicas que vejo desses sistemas em interacção com o meu modelo.

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    1. Sim, o maxi anda por lá a mais há algum tempo...ja em 2010, quando alternava na lateral com o Amorim a diferença se fazia sentir, e o maxi da altura não m parecia tão mau...tb punha o Amorim a lateral na impossibilidade de o por no miolo...e um belíssimo reforço a meu ver... E espero que tenhas razão, quando apontas a possibilidade da exibição de domingo se dever a falta de rotinas e processos num novo esquema e dinâmica, que tire o melhor partido de markovic e djuricic...um 4-4-2 em diamante...

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  9. Daniel, atenção, eu não disse que ele o estava a fazer. Disse que era uma possibilidade.
    Abraço

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    1. 30 e Baggio (já não bastava chatear-te no Posse de Bola ainda te venho "melgar" fora de casa)

      "Estará Jesus a tentar mudar alguma coisa? Nomeadamente colocar mais gente dentro? Estará a mudar a dinâmica de criação de linhas de passe? até que ponto a confusão neste jogo, não se deverá a isso?"


      Se for esse o caso, não é um bocado "á última hora"? Não me pareceu que fosse isso o que foi trabalhado na pré-época. Não deveria isso ter sido trabalhado há mais tempo? E por falar em tempo, achas que demora muito a criar essas novas dinâmicas? Mais uma, pode essa, eventual, mudança estar relacionada com uma possível preparação da saida de Matic (ou não tem nada a haver)?

      Abraço

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  10. LGS,

    Sim. Deveria ter sido trabalhado desde o primeiro dia.
    É em cima da hora, se ele estiver realmente a mudar.
    São dinâmicas que demoram o tempo adequado a capacidade de operacionalizar do treinador, mas sobretudo de compreensão dos jogadores. Isto seria algo "natural" para Aimar e Saviola, por exemplo. Pode não ser tão pacífico para outros.
    Veja se Guardiola no Bayern a trabalhar desde o primeiro dia um modelo complexo e a evolução tem sido muito gradual e lenta.

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