terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Lendas: Vitor Baptista, o Génio e Louco

Se de um leque de grandes glórias do futebol mundial, me dessem um nome a escolher, para ver ao vivo, Eusébio, Ian Rush, Coluna, Pelé, Maradona, Platini, Beckenbauer, Zico e tantos outros colossos, eu rejeitaria. Se tivesse oportunidade, só queria ter tido o privilégio de ter visto um: Vitor Baptista.

Desde muito novo me deliciei a ouvir as suas histórias. Dos meus familiares e de pessoas que conviveram com ele e com a sua vida, quem ouve as suas histórias e lê os seus testemunhos não pode ficar indiferente aquele que, tal como os reis, teve um cognome sui generis: "O Maior".

Conta a história que num Torneio de Futsal onde jogou contra Quinito (Esse mesmo, o treinador de futebol) deu o passo decisivo para a carreira de futebolista. Os olheiros do Vitória de Setúbal nem ficaram muito entusiasmados com ele, mas a insistência do jovem rebelde para com o irmão de Jaime Graça, então ao serviço do Vitória, levaram Baptista a Setúbal.



Aos 18 anos já era figura da equipa setubalense e venceu uma Taça de Portugal. Transferiu-se para o Benfica, na maior transferência até então de sempre do futebol português, com os encarnados a darem três mil contos e três jogadores (entre eles o lendário José Torres) ao Setúbal em troca do Maior. Reza a lenda que Vitor Baptista poderia ter sido o melhor jogador português de todos os tempos, sim, isso mesmo, à frente do rei Eusébio.

A cabeça que não tinha, as drogas, o álcool, as mulheres, o mundo do crime, afastaram-no do rumo certo e do caminho que qualquer ser humano capaz tem de ter. Vitor Baptista viu tudo subir-lhe na vida cedo de mais e acabou de forma trágica (a pedir dinheiro na rua, pouco tempo antes de morrer).

Uma das histórias mais sublimes da sua vida acontece num derby com o Sporting. O avançado benfiquista recebeu uma bola no peito, fez um cabrito a um defesa contrário, driblou outro jogador e atirou uma bomba para o fundo da baliza. Viria-se a aperceber que tinha perdido um brinco, coisa extravagante e completamente nova na altura, de ouro e diamante. Colocou, em pleno jogo, jogadores e árbitros à procura do brinco durante 15 minutos. Não o viria a encontrar e nada mais fez até final do jogo.

As histórias loucas, próprias da personalidade de um verdadeiro génio, foram-me contadas ao longo dos tempos. No primeiro jogo europeu do Benfica contra o Liverpool, não lhe apeteceu jogar, simulou uma lesão e quase era expulso do clube. Só Humberto e Toni o evitaram.

Numa digressão do Benfica à Russia, recusou-se a entrar em campo pois os russos pareciam-lhe amadores, e ele só jogava contra profissionais. Apresentou-se no aeroporto de t-shirt e calças rotas, com todos os outros colegas de fato.

No regresso a Setúbal, organizou uma tourada, populares nas bancadas, estádio cheia, aparece Vitor Baptista sobressaltado. Tinha-se esquecido dos touros. Já no Boavista, aparecia nos treinos de Jaguar, vestido com fato e gravata e chinelos de enfiar no dedo. No Tomar, onde também jogou, reza a lenda que expulsou vezes sem conta o treinador do balneário pois simplesmente não lhe apetecia ouvi-lo.

Um autêntico George Best à portuguesa. Da glória à tragédia em minutos. Foi várias vezes preso, trabalhou em cemitérios e como funcionário da câmara de Setúbal para limpar as ruas. Acabou sem nada, quando poderia ter tido tudo e, no fundo, nada conquistou.


Cronologia:

- Despontou nas margens do seu Sado, em torneios de futebol de salão. Aos 16 anos logo o Vitória de Setúbal tratou de o assegurar: 500 escudos por mês e pensão, eram a vida nova do aprendiz de electricista.

- Em Setúbal brilha, estreando-se nas primeiras categorias com apenas 17 anos. O Sport Lisboa e Benfica levaria a melhor sobre o Sporting na disputa pela maior promessa do futebol português da altura.

- Pela libertação da sua carta o Vitória de Setúbal arrecadou 3.000 contos e ainda recebeu, a título definitivo, José Torres, Praia e Matine. Era a maior transferência de sempre do futebol português.


- Na Luz alternou momentos de rara qualidade com outros que haveriam de o levar à decadência: Múltiplos foram os episódios envolvendo Dinheiro, Carros, Álcool, Mulheres e Drogas, enfim um cocktail verdadeiramente explosivo e pouco condizente com a vida de um profissional de futebol.

- Em 1978 queria um Porsche Carrera e 650 contos mensais para permanecer na Luz. O clube encarnado anuiu em relação à viatura mas não satisfez as pretensões salariais, limitadas a 550 contos. Não aceitou e regressou a Setúbal. Iria ganhar 100 contos por mês...

- Rumaria de seguida ao Bessa, onde também arranjaria desentendimentos salariais com Valentim Loureiro e dava sequência a alguns episódios absolutamente
inesquecíveis: Certo dia, O Maior abandona o campo porque... não jogava em pelados!

- Em 1980, a convite de António Simões, jogou com George Best, o seu "irmão-gémeo" do futebol, no San Jose Earthquakes. Nessa mesma equipa alinhavam também Guus Hiddink, Milan Mandaric, Bill Foulkes, entre outros. Apesar do contrato de 2,5 milhões de dólares e do raro Corvette descapotável exigido, não o conseguiram manter nos States por muito tempo: 2 jogos e regresso a Lisboa.

- Regressa a Portu
gal e jogaria ainda no Amora, no Montijo, no União de Tomar, no Monte da Caparica e acabaria nos regionais, em representação do Estrelas do Faralhão.

- Foi sempre um rebelde, um "Génio Louco", incompatibilizando-se facilmente com os seus treinadores. Alguns exemplos: Mário Wilson em 1975, John Mortimore e José Maria Pedroto em 1976 e Juca em 1977 (Com Juca, via mesmo chegar ao fim a sua participação na equipa das quinas: Chegou atrasado ao treino, insultou Juca e chamou "malucos" aos colegas).

História:

Nome Completo: Vítor Manuel Ferreira Baptista
Alcunha: O Maior / O Rapaz do Brinco / O Gargantas / O Rapaz dos Pés de Ouro / Meu Deus Nacionalidade: Portuguesa
Local de Nascimento: São Julião / Setúbal - Portugal
Data de Nascimento:
18 de Outubro de 1948 (Faleceu a 1 de Janeiro de 1999)
Posição: Avançado
Altura:
1,78m
Peso:
76Kg
1985/86 - Estrelas Faralhão - ? Jogos / ? Golos 1984/85 - Estrelas Faralhão - ? Jogos / ? Golos 1983/84 - Monte da Caparica - ? Jogos / ? Golos 1982/83 - U. Tomar - ? Jogos / ? Golos 1981/82 - Montijo (Jogador-Treinador) - ? Jogos / ? Golos 1980/81 - Amora - 4 Jogos / 0 Golos 1980 - San Jose Earthquakes - 2 Jogos / ? Golos 1979/80 - Boavista - 15 Jogos / 8 Golos 1978/79 - Vit. Setúbal - 19 Jogos / 7 Golos 1977/78 - S.L.Benfica - 15 Jogos / 8 Golos 1976/77 - S.L.Benfica - 6 Jogos / 6 Golos 1975/76 - S.L.Benfica - 16 Jogos / 9 Golos 1974/75 - S.L.Benfica - 23 Jogos / 3 Golos 1973/74 - S.L.Benfica - 21 Jogos / 9 Golos 1972/73 - S.L.Benfica - 14 Jogos / 6 Golos 1971/72 - S.L.Benfica - 17 Jogos / 9 Golos 1970/71 - Vit. Setúbal - 26 Jogos / 22 Golos 1969/70 - Vit. Setúbal - 22 Jogos / 11 Golos 1968/69 - Vit. Setúbal - 17 Jogos / 0 Golos 1967/68 - Vit. Setúbal - 15 Jogos / 0 Golos 1966/67 - Vit. Setúbal - 0 Jogos / 0 Golos


2 comentários:

  1. Um génio, um exemplo.

    Daquilo que é ser um predestinado e não ter "cabeça".

    Muitas outras estórias envolvendo O Maior foram passando de boca em boca, algumas verdades, outras invenções.

    Uma das que ultimamente ouvi foi de que chegou a ir para os treinos a cavalo (julgo que no Montijo, onde terá sido jogador-treinador).

    No campo era fantástico, fora dele uma desgraça.

    Lembrá-lo à porta da antiga Luz:

    - "Dá-me uma moeda"

    - Para que queres a moeda, Vítor?

    - Para ver o Benfica. Lá dentro, onde fui o maior.

    R.I.P.

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  2. Era sem a menor dúvida o MAIOR e só reconhecido por alguns. Recordo-me no funeral deste grande jogador ver lá entre outros o Eusébio. Prometo passar a mensagem de que houve um jogador que colocava no peito e rematava de primeira para o golo: VITOR BATISTA O MAIOR!

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