Tem sido usual nos últimos dias na minha área de estudo surgirem questões de discussão sobre a maturação e o desenvolvimento sustentado dos jovens face a contextos que os rodeiam e que influenciam de forma significativa e decisiva o seu rendimento quer cognitivo, motor ou psico-social. Muito se vem falando de "queimar etapas" e do contra-senso que isso vem sendo mas, eu, pelo contrário, entendo que essa é apenas uma questão efémera que será sempre guiada para um trajecto social e afectivo que influenciará o rendimento propriamente dito em termos desportivos.
Isto porque um grande jogador precocemente terá, até pelas exigências que ele próprio vai procurando, de saltar certas etapas e conhecer ritmos e desafios diferentes para ter estímulos e obrigações mais exigentes que lhe permitam ter uma maturação mais adequada à qualidade de rendimento que terá de apresentar. Ou seja, o jovem de 8 anos, muito forte tecnicamente, pelo menos mais capaz do que todos os outros da sua idade, terá obrigatoriamente de passar para a etapa seguinte (jogar contra meninos que lhe coloquem dificuldades diferentes, logicamente maiores) de forma a não se correr o risco do menino virtuoso sentir demasiadas facilidades com os seus e descurar certo tipo de intensidades e gestos técnicos que terá sempre de trabalhar e que contra os da sua idade (num nível bastante mais baixo que o dele), bastará o "meter a bola para a frente" e correr ou o simular que chuta para cortar para dentro. São necessárias exigências e intensidades adequadas àquilo que são os estímulos que as crianças procuram face ao seu rendimento.
Enquadrando o meu texto de hoje nesta matéria de reflexão, proponho-me a falar de dois nomes: Miralem Pjanic e Neymar. Quero com isto dizer que os dois, enquadrados numa avaliação de talento precoce, demonstram em idade de maturação rendimentos díspares face às perspectivas criadas sobre eles ainda em idade de desenvolvimento e formação. Pegando na frase de José Mourinho, "Um treinador que só percebe de futebol, de futebol nada sabe", é essencial existir um acompanhamento permanente e uma modelagem de comportamento fundamental da parte daqueles que são os modelos estruturais do comportamento dos jovens: as figuras do poder e, essa figura, no contexto do futebol, será sempre o treinador.
Miralem Pjanic chegou muito cedo a França, nasceu num contexto de guerra (Bósnia Herzegovina) e teve, certamente, um tipo de acompanhamento psicológico diferente daquele que foi dado à grande maioria dos jogadores das camadas jovens do Metz e Lyon. Hoje em dia olhamos para um jogador a quem desde cedo foram reconhecidas capacidades muito acima da média, claramente evoluído sob o ponto de vista da própria inteligência e maturidade que apresenta em todos as suas acções no jogo, na vida, e no contexto de desenvolvimento enquanto futebolista profissional de alto nível.
Neymar, que muito jovem viu os holofotes da fama apontarem-se efervescentemente para si, tem aparecido de forma sustentada no Santos onde assume papel de destaque, mas muitas têm sido as notícias que têm saído a público sob a sua conduta fora dos relvados e muito se vem questionando o facto de ainda não ter dado o salto qualitativo que se esperava dele quando tem já 18 anos - e eram apontadas qualidades claramente ao nível dos predestinados para ele -, tal como, aliás, sempre o reconheci.
Acontece que, num básico exercício que vise compreender a capacidade mental, que se reflecte em campo e origina determinados comportamentos, face a acontecimentos que vão surgindo, porque Neymar - o melhor goleador até então - fez apenas dois golos desde que Robinho está de regresso ao Vila Belmiro?
Porque tem Neymar mantido um comportamento, nem sempre humilde, perante as suas exibições? Ao perder uma bola frente ao Palmeiras, faz uma entrada despropositada e recebeu ordem de expulsão. Insultou o árbitro, fala-se em 18 jogos de suspensão. Numa altura tão fundamental da carreira, Neymar vai sendo falado, e muito, é verdade, mas nem sempre pelos melhores motivos e a um nível que já se esperava que ele tivesse ultrapassado até para a própria imprensa.
Quanto a Pjanic, surge como uma das principais figuras do Lyon e da selecção da Bósnia, embora em ambas não seja ainda um titular indiscutível. Acontece que suportando esse factor emocional, sempre que é chamado, corresponde com boas exibições. Veja-se, até ao momento, nos seus maiores níveis de obrigatoriedade e exigências, a forma como correspondeu: Carregou a Bósnia às costas frente a Portugal na Luz e em Sarajevo. Foi peça de xadrez fundamental na forma como o Lyon eliminou, recentemente, o Real Madrid num Bernabéu desesperado por uma vitória na Liga Milionária.
É importante referir a necessidade de se potenciar ao máximo a capacidade dos atletas. O talento natural que detém, contudo, é uma ínfima parte daquilo que necessitarão para consolidar o seu rendimento no topo - de resto, tenho escrito ao longo deste blog vários exemplos disso mesmo. Pjanic é, hoje em dia, um jogador totalmente completo sob o ponto de vista da maturidade vs. talento.
Neymar, apesar de, talvez, ser o mais talentoso jogador mundial da sua idade, denota ainda índices de maturidade nas suas acções técnicas, psicológicas e sociais, completamente distintas da linha orientadora certa, se assim se pode delinear. Será sempre um caminho doloroso. E terminando com uma frase que visa fazer uma retrospectiva a tudo o que tem sido feito ao nível do futebol de formação por alguns técnicos formadores:
"O bom treinador é aquele que prescinde dos resultados competitivos sob a necessidade de trabalhar e formar os seus atletas com a finalidade de vir a colher todos esses frutos anos mais tarde". Para recordar...
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